quarta-feira, 30 de novembro de 2016

O que não é Agroecologia.


Por: Francisco Roberto Caporal [1]

Já faz tempo que tentamos alertar para o uso abusivo, equivocado, maldoso, oportunista ou por má fé, do vocábulo Agroecologia. E não por acaso, mas porque vínhamos observando que estava ocorrendo uma apropriação, cooptação e uso temerário da palavra, sem levar em conta os conceitos e princípios nem, muito menos, as bases epistemológicas da Agroecologia.

Para começo de conversa, é bom registrar que Agroecologia não é tudo, nem é a salvação para todos os males. Já escrevemos em outro lugar: Agroecologia não é a panaceia salvadora para todos os problemas das sociedades. A Agroecologia não se propõe a tomar o lugar de outras ciências. Logo, há coisas que se resolvem no âmbito das ciências exatas ou naturais, assim como há coisas que se resolvem no campo da política e não são, necessariamente, do campo de estudo da Agroecologia.

Como a palavra explicita, quando falamos de Agroecologia se está tratando de algo que tem a ver com AGRO e com ECOLOGIA.

Segundo a Wikipédia, o prefixo agro tem origem no verbete latino agru que significa "terra cultivada ou cultivável". Já a palavra "agricultura" vem do latim agricultūra, composta por ager (campo, território) e cultūra (cultivo), no sentido estrito de cultivo do solo.

Por outro lado, a ecologia é a ciência que estuda o meio ambiente e os seres vivos que vivem nele, ou seja, é o estudo científico da distribuição e abundância dos seres vivos e das interações que determinam a sua distribuição. A palavra tem origem no grego “oikos” que significa casa e “logos” que significa estudo.

Visto isso, vamos adiante. Nossa intensão é tentar, da forma mais didática possível, explicar o que não é Agroecologia.

Vejamos. Muita gente usa a palavra Agroecologia para se referir a uma agricultura sem o uso de agrotóxicos e/ou fertilizantes químicos sintéticos. Ora, este tipo de agricultura pode ser resultado não da adoção/aplicação de princípios ecológicos, mas simplesmente por tratar-se da impossibilidade do uso destes insumos, por diferentes razões, inclusive pela falta de recursos financeiros para compra-los. Agricultores pobres que não usam insumos químicos não são necessariamente agroecológicos.

Também não é necessariamente agroecológica, uma agricultura em que foram substituídos os produtos químicos por insumos biológicos, naturais ou orgânicos e ponto. Neste caso poderemos estar frente ao que vem sendo tratado como “convencionalização” da agricultura orgânica ou ecológica. Isto é, se mantem a mesma lógica da agricultura industrializada da revolução verde, inclusive o modelo de monocultivos, só que neste caso sem a utilização de insumos químicos. As chamadas produções “corporgânicas”, que já existem em muitos lugares, certamente são orgânicas e certificadas, mas não são sustentáveis do ponto de vista socioambiental e muito menos agroecológicas. O mesmo ocorre na agricultura familiar, quando esta se especializa e passa a dedicar-se ao monocultivo de uma única espécie (animal ou vegetal).

Por outro lado, há os que confundem Agroecologia com “um tipo de agricultura”. Vejamos. Dadas as bases epistemológicas da Agroecologia, faz-se necessário considerar, pelo menos dois aspectos centrais: por um lado o fato de que a agricultura é uma prática social que é influída, entre outras coisas, pelos elementos de cultura, valores, normas, regras e cosmovisões dos grupos sociais que a praticam. Por outro lado, trata-se de modificar ecossistemas visando a produção de alimentos, fibras, matérias primas, etc, daí porque os agroecossistemas (ecossistemas modificados pela prática da agricultura) passam a ser primeira unidade de análise da Agroecologia (digamos: a escala de propriedade, comunidade ou território). Não obstante cada agroecossistema poderá apresentar características biofísicas, condições ecológicas que os diferenciam dos demais. Se isso é verdade, a aplicação dos princípios da Agroecologia nos levará a uma diversidade de “tipos de agriculturas” resultantes de como sejam os arranjos entre os sistemas sociais/culturais e os sistemas ecológicos de cada lugar, ou ainda, de diferentes formas de integração dos saberes locais/tradicionais com os conhecimentos científicos aplicados.

A Agroecologia não é, portanto, um tipo de agricultura, nem uma agricultura alternativa. Compreender desta forma tem levado a muita gente falar e escrever equivocadamente: “fazer a transição para a Agroecologia”. Seria o mesmo que aplicar um Teorema de Pitágoras e dizer que se está fazendo a transição para a matemática.  

De fato, a Agroecologia por ser uma transdisciplina, nos oferece um cabedal de conhecimentos de muitas disciplinas que, em diálogo com os saberes locais/tradicionais, e o uso de metodologias e tecnologias apropriadas, contribuirá para o desenho de agroecossistemas ou de sistemas agroalimentares mais sustentáveis do ponto de vista socioambiental, culturalmente mais aceitáveis e economicamente viáveis.

Assim, não é por acaso que diversos autores têm recomendado que nos processos de transição e redesenho de agroecossistemas, sejam observadas diferentes dimensões da Agroecologia, tais como as dimensões técnico-agronômica; socioeconômica e cultural; sociopolítica e, mais recentemente, a dimensão energética.

Entendido deste modo, podemos afirmar que a Agroecologia é uma ciência do campo da complexidade, que busca superar os enfoques cartesianos, reducionistas, e adota um enfoque sistêmico e uma abordagem holística. Nada disso é novo. Apenas recalcamos aqui para tentar refutar alguns argumentos que afirmam que a Agroecologia é uma prática ou um movimento social.

Vamos por partes. Primeiro, se a Agroecologia é uma ciência ela não pode ser uma prática. Na verdade, como visto antes, ela nos oferece ferramentas para a construção de agroecossistemas mais sustentáveis, logo nos dá as bases para muitas práticas que podem ser bastante diferenciadas. Muitas delas podem ser estritamente técnico-agronômicas, mas outras podem ser de outra natureza: sociais, culturais, políticas, etc.

Por outro lado, a Agroecologia também não é um movimento social. Na verdade existem muitos movimentos sociais agroecológicos, que são formados por adeptos da Agroecologia, por pessoas e organizações que acreditam que esta ciência é revolucionária, na medida em que vem se constituindo como um novo paradigma que poderá contribuir para retomar o curso alterado da coevolução social e ecológica, que foi rompido naqueles lugares onde o modelo da revolução verde se tornou hegemônico. Assim, não é a Agroecologia que é um movimento social, como muitos escrevem. A Agroecologia é, na verdade, o elemento galvanizador de quantos participem desses movimentos. É o que lhes dá identidade e unidade. Com isso, não se nega a importância dos movimentos agroecológicos, pelo contrário, se reforça e se destaca seu papel como movimento social que luta por estabelecer um novo caminho para o avanço das sociedades nos processos de desenvolvimento rural e da agricultura, apontando que este caminho pode ser orientado por esta nova ciência em construção, a Agroecologia.

De igual modo, a não compreensão da Agroecologia como uma ciência, leva a que muitos utilizem frases como: “existe mercado para a Agroecologia”, “a Agroecologia agora é uma política pública” ou ainda, “vamos fazer uma feira de Agroecologia”. Todas estas frases mostram um enorme equívoco gnosiológico[2].

Por fim, cabe salientar que existem diferentes tipos de agriculturas alternativas, com diferentes denominações, enfoques, técnicas, normas, preparados, etc, que podem ser chamadas de ecológica, biológica, orgânica, natural, permacultura, biodinâmica, etc. Nada contra elas, mas é importante salientar que esses tipos de agriculturas não necessariamente tomam como referência as bases epistemológicas da Agroecologia e não necessariamente observam as diferentes dimensões antes mencionadas. Em muitos casos, sequer tratam de redesenhar os agroecossistemas tendo como referência o estabelecimento de novas relações funcionais e estruturais de base ecológica. Não compreender estas diferenças tem levado a outros equívocos, como usar indistintamente “produtos orgânicos ou agroecológicos”, ou dar o nome de Feira Agroecológica ao local onde se vende estritamente produtos orgânicos.



[1] Engenheiro Agrônomo, Doutor em Agroecologia pela Universidad de Córdoba, Espanha. Membro do Núcleo de Agroecologia e Campesinato – NAC/UFRPE. 25/11/2016. Email: caporalfr@gmail.com
[2] Gnosiologia = Parte da Filosofia que trata dos fundamentos do conhecimento.

terça-feira, 9 de agosto de 2016

A Agroecologia não é contra nada. É a favor da vida.

Por: Francisco Roberto Caporal* 

Outro dia, conversando com alguns alunos, me questionaram se a Agroecologia é contra os agrotóxicos. Lembrei-me de conversas infindáveis com o falecido companheiro José Antônio Costabeber, e respondi: Não, a Agroecologia não é contra nada a Agroecologia é a favor da vida. A Agroecologia não é contra os agrotóxicos ou contra os fertilizantes químicos. Todos ficaram surpresos. 

Então, tentei explicar. A Agroecologia busca promover, apoiar a transição para agriculturas e sistemas agroalimentares mais sustentáveis. Esses tipos de agriculturas ambientalmente compatíveis e mais duráveis ao longo do tempo, não comportam o uso de qualquer elemento que, por sua natureza, cause danos ao meio ambiente e à saúde, seja das pessoas, seja das outras formas de vida. É simplesmente impossível alcançar equilíbrio ecológico em sistemas que utilizam pesticidas e fertilizantes químicos. Logo, agriculturas e os sistemas agroalimentares mais sustentáveis, por definição, não podem usar nada de agrotóxico ou fertilizante químico, não porque a Agroecologia seja contra eles, mas porque eles são incompatíveis com a busca de sinergias ecológicas e socioeconômicas positivas que se necessita para alcançar melhores níveis de sustentabilidade na agricultura e nos sistemas agroalimentares. Aliás, um dos cinco axiomas da sustentabilidade, de Heinberg, afirma justamente isso: “A sustentabilidade requer que as substâncias introduzidas no ambiente pela atividade humana sejam minimizadas e tornadas inofensivas para as funções da biosfera.” Agrotóxicos e fertilizantes químicos jamais serão inofensivos para as funções ecológicas da biosfera. 

Por esta mesma razão, a Agroecologia não é contra os transgênicos. O que ocorre é que o uso de sementes transgênicas pressupõem elevados níveis de riscos ambientais e à saúde, muitos ainda desconhecidos, motivo pelo qual, neste caso, a Agroecologia prega a necessidade de se aplicar o Princípio da Precaução, isto é: não se pode utilizar sementes de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs), enquanto não se sabe, exatamente e cientificamente, que os transgênicos NÃO causarão danos ao ambiente e à saúde. Logo, não se devem utilizar estas sementes, até que a ciência possa provar que os OGMs são inócuos. E, até hoje, a ciência não provou isso. Ao contrário, as evidências que se tem, até agora, indicam que sim, os OGMs causam danos à saúde e ao meio ambiente. Portanto, outra vez, não se trata da Agroecologia ser contra, mas sim da inadequação do uso de sementes transgênicas quando se busca mais sustentabilidade socioambiental na agricultura e no desenvolvimento rural. Lembrando sempre que a Agroecologia busca a construção de sistemas agroalimentares que levem a melhor qualidade de vida e a mais proteção ambiental.

Dito isto, os alunos me perguntaram: mas a Agroecologia é contra o agronegócio? Para surpresa de muitos, respondi que não. A Agroecologia não é contra o agronegócio. A Agroecologia é uma ciência e uma ciência não é contra nada. Aliás, no Brasil, o uso da expressão agronegócio tem, em geral, uma natureza política-ideológica e não técnicoeconômica ou social. 

Aqui no Brasil, a tradução da palavra “agribusiness”, tomou uma conotação políticaideológica, para fazer referência aos grandes produtores, latifundiários (mesmo que improdutivos), à agricultura industrial capitalista de exportação. Conceitualmente, é um equívoco, que só ganhou expressão por razões ideológicas. Por acaso, pequenos agricultores não participam do agronegócio? Não compram e vendem no mercado? Não têm suas agroindústrias familiares? O que é isso, senão agronegócio? Tanto é verdade, que em algumas regiões, agricultores familiares falam de “agronegocinho”, para dizerem que estão no agronegócio, mas de pequena escala. É uma piada! Não tem sentido. 

A Agroecologia não nasce como alternativa ao mal chamado “agronegócio” ou ao uso de agrotóxicos e fertilizantes químicos. Não, a Agroecologia nasce da busca que faziam alguns pesquisadores no sentido de entender porque alguns sistemas de produção de comunidades tradicionais apresentavam melhores padrões de sustentabilidade socioambiental. Eles procuravam entender as relações socioecológicas presentes nestes sistemas que lhes asseguraram durabilidade ao longo do tempo, que alimentaram gerações e gerações sem depredar o meio ambiente, que garantiram a reprodução social de comunidades inteiras, por milênios. 

Assim, embora, epistemologicamente, a Agroecologia não se adeque a sistemas de produção de larga escala, a grandes extensões de monoculturas, isso não significa que ela é uma ciência contra eles. Simplesmente, seus conceitos e princípios não são aplicados a essas situações, devido à complexidade que isto significaria. Isso não quer dizer que seja impossível fazê-lo. Por isso mesmo, o esforço das ações baseadas no enfoque agroecológico se centra na agricultura de base familiar, nas agriculturas dos povos tradicionais e camponeses, pois é neste ambiente sociocultural que se encontram, quase sempre, as condições e conhecimentos tradicionais mais favoráveis para a construção de agriculturas mais sustentáveis. 

Isso, entretanto, não significa que os conceitos e princípios ecológicos e socioculturais que orientam a Agroecologia não possam ser aplicáveis a áreas maiores. Não é o tamanho da área que define a aplicação ou não desses princípios e conceitos, mas sim, as condições objetivas de natureza ecológica, econômica, socioculturais e éticas que se encontram em cada agroecossistema, em cada realidade. 

A agricultura orgânica já alcançou isso, mostrando que é possível aplicar práticas mais ecológicas em uma propriedade de 100, de 1.000 ou mais hectares. As produções corporgânicas, já estabelecidas em muitos lugares, são uma demonstração desta possibilidade.

O salto, no entanto, para a adoção dos conceitos e princípios da Agroecologia, vai além da simples substituição de insumos. Entre outras coisas, é necessário que se adotem critérios sociais adequados, com equidade entre as pessoas que manejam esses agroecossistemas, isto é, que a distribuição do produto e renda desses sistemas seja equitativa. Que haja equidade de gêneros. E, ainda, desde que se eliminem as monoculturas e se implantem sistemas biodiversos; que se consigam formas de melhorar a qualidade física, química e biológica dos solos, sem o uso de fertilizantes químicos de síntese; que se reduzam os processos de sobre-mecanização, sem aumentar a penosidade do trabalho. Que se estabeleçam agriculturas que apresentem maior resiliência e níveis de produção e produtividade com maior durabilidade no tempo e menor dependência de insumos externos; que se estabeleçam processos de comercialização menos impactantes ao meio ambiente, reduzindo o consumo de matéria e energia, etc. Dadas estas e outras condições, exigidas pelo enfoque agroecológico, é possível sim que as dimensões socioeconômicas, técnico-produtivas, culturais e éticas da Agroecologia sejam aplicáveis a áreas mais extensas do que os quatro módulos fiscais que definem a agricultura familiar. 

Não estou querendo dizer, nada novo. Basta olhar algumas (mas não todas) das enormes áreas de extrativismo ou algumas das grandes áreas de sistemas agroflorestais que temos neste País e que respondem aos princípios e critérios agroecológicos. A Agroecologia, portanto, não é uma ciência só para os minifúndios ou só para a produção de pequena escala. Se admitíssemos isso, estaríamos condenando a Agroecologia a um gueto. Não obstante, temos que relativizar esta questão, pois o limite de tamanho do agroecossistema será dado pela possibilidade ou não de serem aplicados os critérios agroecológicos em sua plenitude.

Isso não quer dizer que os Agroecólogos deixem de lutar em favor da reforma agrária, pelo contrário, para alcançar a amplitude da dimensão socioeconômica da Agroecologia, é fundamental a luta por mais equidade na distribuição e posse da terra, até porque este é um elemento fundante de processos mais sustentáveis de desenvolvimento rural pelos quais estamos empenhados. Entretanto, esta tem que seguir sendo uma luta mais ampla, que envolva setores importantes da sociedade interessados em ver avançar a justiça social. 

Tenho consciência, pelas questões colocadas neste texto, de que estou transitando em um terreno movediço, em temas geradores de muita controvérsia. Entretanto, nós, Agroecólogos, não podemos enfiar a cabeça na terra, como avestruzes, para não ver o entorno que nos desafia. Por isso, os temas aqui abordados são propícios para a reflexão e o debate, no processo de construção de conhecimentos que está em marcha no campo da Agroecologia.


*O autor é Engenheiro Agrônomo, Doutor em Agroecologia pela Universidade de Córdoba, Espanha, professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco, membro do Núcleo de Agroecologia e Campesinato da UFRPE. Blog: frcaporal.blogspot.com.br. Email: caporalfr@gmail.com   

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Ana Primavesi: Observar, Conhecer e Integrar - Passos para uma Ecologia da Vida*

A partir de seu olhar sobre o solo, Ana Primavesi defende a necessidade de apreender amplamente as dinâmicas formas de vida para só então se integrar num sistema produtivo ecológico.


Por: João Vitor Santos

Ela tem 96 anos e a paixão de toda a vida: o solo. Essa é Ana Maria Primavesi, pioneira no Brasil no tema da produção ecológica. Uma pesquisadora de laboratório e campo, capaz de pôr em prática uma perspectiva sistêmica sobre as formas de vida. “É preciso observar mais a natureza”, resume ela, ao falar sobre os caminhos para se produzir alimento saudável para o ser humano e um meio ambiente sadio. Hoje, vive com a filha, Carin, numa casa na cidade de São Paulo, construída por ela nos anos 1950, cercada de jardins. Apesar das limitações físicas em decorrência de uma lesão no fêmur, a professora procura ir ao campo, mesmo que seja pertinho da metrópole.

Para compreender o que está por trás da “lógica Primavesi”, é preciso também conhecer um pouco mais dessa mulher. Nasceu em 1920 em St. Georgen ob Judenburg, na Áustria. Chegou ao Brasil em 1949 e naturalizou-se. “Após a guerra, com tantas mortes na família, também dos irmãos queridos, eu e meu marido, que tínhamos perdido todas as propriedades agrícolas, decidimos que era preciso procurar por paz, respirar ares novos, onde houvesse maior possibilidade de realizar nossos sonhos e esperanças”, recorda. 

Ana Maria cresceu em meio ao campo e, atenta e observadora, daí foi um passo para se tornar uma cientista da área. “Meus pais eram muito ligados à atividade agropecuária e florestal. E na universidade éramos levados a realizar atividades de pesquisa desde o primeiro semestre. Fui treinada a observar já em termos de sistema de produção, de forma holística”. “Também tive dois professores que ensinaram a fazer um tipo de ‘exame clínico’ com muita observação e visão integrada”, recorda. Assim que chegou ao Brasil, ela e o marido passaram a produzir no interior de São Paulo, a partir de técnicas ecológicas de manejo do solo. Assim, aliava a pesquisa nos laboratórios à prática de campo. “Tivemos certeza de nosso caminho quando meu marido conseguiu produzir um trigo tipo canadense (de altíssima qualidade) em um solo degradado”, destaca.

Mas no que consistem seus princípios? Para Ana, é preciso “observar a natureza, em como ela, a partir de ecossistemas primários, construía os ecossistemas naturais clímax, com alta capacidade de manter vida e produção, e com todas as estruturas de ecossistemas desenvolvidos”. Ou seja, observar a ecologia da vida e, assim a conhecendo, se integrar ao sistema amplo capaz de gerar vida, produzir e até corrigir desequilíbrios com o mínimo de interferência humana. É mais do que pensar em produção orgânica, é também pensar em produção ecológica.

Apesar de tudo, a pesquisadora não se entrega, e isso pode ser constatado na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line em abril de 2016. Com quase um século de vida, Ana aceita o convite para a entrevista por e-mail. Conta com a ajuda de Carin para lidar com a internet. É uma forma de seguir propagando suas ideias e semeando esperança. “A sociedade é parte do aspecto ambiental, mas insiste-se em separar isso nos cursos universitários. Esse conhecimento fragmentado, compartimentado, analista, especializado é o grande mal”, sentencia, ao mesmo tempo que provoca a pensar numa “educação ambiental de como a vida funciona”.

Ana Maria Primavesi é graduada em Agronomia pela Universidade Rural de Viena, com doutorado em Ciências Agronômicas. Em 2012, recebeu o prêmio mundial da agricultura orgânica pela Internacional Federation of Organic Agriculture Movements - IFOAM. Foi professora na Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, pesquisadora da Fundação Mokiti Okada, de São Paulo, e agricultora, pois praticou as técnicas da agroecologia na sua fazenda, em Itaí, São Paulo. Seus ensinamentos podem ser encontrados em cerca de 100 artigos científicos inéditos e 12 livros. Entre os trabalhos de maior influência estão: Manejo Ecológico do Solo: a agricultura em regiões tropicais (São Paulo: Nobel, 1984); Agroecologia: ecosfera, tecnosfera e agricultura (São Paulo: Nobel, 1997); Manejo ecológico de pragas e doenças: técnicas alternativas para a produção agropecuária e defesa do meio ambiente (São Paulo: Nobel, 1988); Manejo ecológico do solo: a agricultura em regiões tropicais (São Paulo: Nobel, 1984); Agricultura sustentável: manual do produtor rural (São Paulo: Nobel, 1992); Manejo ecológico de pragas e doenças: técnicas alternativas para a produção agropecuária e defesa do meio ambiente (São Paulo: Nobel, 1988); Cartilha do solo (São Paulo, Mokiti Okada 2006); Pergunte ao Solo e às Raízes (São Paulo: Nobel, 2014); A Convenção dos Ventos (São Paulo: Expressão Popular, 2016).

Acaba de ser lançada sua biografia por Virginia Knabben: Ana Maria Primavesi, histórias de vida e agroecologia (São Paulo: Expressão Popular, 2016).

Confira a entrevista:

IHU On-Line - Como descobriu a sua paixão pelas coisas simples do campo? E como isso a transformou em cientista?

Ana Maria Primavesi - Eu cresci em ambiente rural e meus pais eram muito ligados à atividade agropecuária e florestal (mãe: de canteiros de flores, horta doméstica, plantas medicinais; e pai: de lavouras, criação de gado e atividade florestal). Meu pai fazia melhoramento animal e assim precisava de método e observação. E na universidade nós éramos levados a realizar atividades de pesquisa. Fui treinada a observar, já em termos de sistema de produção, de forma holística. Depois tive dois professores que ensinaram a fazer um tipo de “exame clínico” com muita observação e visão integrada.   

IHU On-Line - Por que a senhora sempre andou tanto no campo quanto no laboratório?

Ana Maria Primavesi - A ciência progride quando sustentada pelos resultados de campo, que por sua vez realimentam as pesquisas científicas com dúvidas a resolver. Com o conhecimento da prática eu tinha muitas dúvidas que precisavam ser esclarecidas. Em realidade, a ciência existe para esclarecer os processos que ocorrem na natureza e que necessitamos conhecer para melhorar o seu manejo e fortalecimento nos sistemas de produção de alimentos e de água doce.

IHU On-Line - A senhora é uma das primeiras no Brasil a tratar do tema agricultura orgânica. Como a senhora descobriu esse tipo de produção? De onde veio sua inspiração?

Ana Maria Primavesi - Em realidade, no início, toda agricultura praticada era orgânica, e, até certo ponto, ecológica. Com ensinamentos de mestres na universidade, fui estimulada a olhar por essa perspectiva. Foram eles que me repassaram os princípios de como analisar o conjunto de fatores em uma atividade agrícola, indo diretamente para a procura das causas. E as causas deveriam ser procuradas com o solo (características de um solo observando na natureza o que resulta maior produtividade de fitomassa ), o comportamento das próprias plantas (sintomas de deficiências minerais, vigor e arquitetura das raízes) e das associações de plantas no campo.

Na realidade, era preciso observar a natureza, em como ela, a partir de ecossistemas primários (rochas aflorando; inóspitos à vida superior e à produção), construía os ecossistemas naturais clímax , com alta capacidade de manter vida e produção, e com todas as estruturas e os serviços ecossistêmicos desenvolvidos. A natureza utiliza as mesmas ferramentas para recuperar solos compactados, mortos biologicamente, abandonados, durante o pousio.

O segredo é a observação, isso eu aprendi com meus pais e alguns professores generalistas (sabem um pouco de tudo do todo). Os especialistas sabem muito de pouco do todo, que chega a ser nada, sabem só de algo específico, sem relação com o todo. Ficam com uma visão muito estreita, para a prática de campo. Esse é também um grande conflito que deveria ser resolvido amigavelmente.  

IHU On-Line - Quais os desafios que enfrentou quando começou a tratar do tema da agricultura orgânica? Quais resistências já foram vencidas e quais ainda persistem nos dias de hoje?

Ana Maria Primavesi - Tivemos certeza de nosso caminho quando meu marido conseguiu produzir um trigo tipo canadense (de altíssima qualidade) em um solo degradado da região de Sorocaba, em São Paulo. O trigo estava sem ferrugem, embora a variedade fosse altamente suscetível. Isso ocorreu após dois anos de práticas de recuperação biológica do solo com coquetel de adubos verdes fibrosos. Quando entramos para a vida acadêmica e docente em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, estávamos no auge da revolução verde que promovia uma agricultura nos moldes de “chão de fábrica”, em que as variabilidades de nossos solos eram uniformizadas com calagens e adubações NPK  pesadas. O objetivo era de atender as exigências de variedades híbridas que respondiam a doses elevadas de nitrogênio, utilizando-se para isso mecanização intensa e irrigação, e depois também herbicidas.

As terras eram uniformizadas. Os olhos d’água e pequenos cursos d’água eram simplesmente riscados do mapa, para facilitar a mecanização. Depois as árvores eram eliminadas para facilitar a administração a olho nu e a aviação agrícola. E, tudo que fosse relacionado à matéria orgânica e seu uso, era proibido. Identificamos que eram promovidos os aspectos físicos e químicos dos solos. Mas não os biológicos. Os biológicos do solo, não das plantas. Os biológicos que usam todo material orgânico, de onde retiram sua energia para agregar o solo e estabilizar os agregados e os macroporos, que são vitais para a saúde das plantas, pois garantem a entrada de água e de ar.

Assim, lutamos pela inclusão por esse aspecto biológico de solo. Isso porque sabíamos que precisávamos de um solo vivo para produzir com abundância e de forma mais barata, pois aumentava a eficiência dos insumos aplicados, que assim poderiam ser utilizados de maneira mais racional.

A luta feroz

Mas a revolução verde não contemplava o aspecto biológico. E a luta foi feroz. Mesmo iniciando como docentes da Universidade nessa visão holística de manejo do solo, da produtividade e da consideração do aspecto biológico por meio do primeiro curso de pós-graduação no Brasil, oficialmente aceito, a resposta deles foi: embora concordemos com esses conhecimentos, não poderemos incluí-los nos cursos regulares de graduação, pois precisamos treinar os estudantes para os concursos públicos, que não contemplam o aspecto biológico.

*Entrevista a Ana Primavesi pela IHU On-Line

quarta-feira, 11 de maio de 2016

"O glifosato é o maior escândalo sanitário da história", diz documentarista

Marie-Monique Robin, que dirigiu "O mundo segundo a Monsanto", critica modelo baseado em veneno e monocultura*
 
 
             Confira a íntegra do documentário ao final da entrevista  - Créditos: institutfrancais

A jornalista e documentarista francesa Marie-Monique Robin, autora do “O mundo segundo Monsanto”, esteve na cidade de Córdoba, no centro da Argentina, e visitou o acampamento de Malvinas Argentina, que resiste à instalação de uma empresa da Monsanto. Ela também conheceu o grupo de mães do bairro Ituzaingó, que lutam por justiça em relação aos casos de câncer na região que são atribuídos às fumigações.
Durante a sua estadia, Marie apresentou seu filme “Agroecologia: as coletas do futuro”, participou de uma roda de conversa na Universidade de Córdoba e declarou como testemunha da megacausa “La Perla”, em que se investigam delitos de lesa-humanidade durante a última ditadura na Argentina.
Em entrevista ao diário La Mañana, a jornalista opinou sobre o “modelo sojero” [termo usado para denominar o modelo de produção centrado no monocultivo de soja] e os impactos do uso de agrotóxicos na sociedade.
La Mañana - Após a visita ao acampamento Malvinas e o encontro com as Mães de Ituzaingó, que sensações você leva de sua visita a Córdoba?
Marie-Monique Robin - O que vejo é que a sociedade civil, os pesquisadores, os médicos e os cidadãos estão acordando da letargia que os acompanhava há 10 anos, quando vim fazer um documentário sobre o avanço da soja na Argentina. Naquele momento, ninguém se preocupava muito com o que estava se passando. Temos que levar em conta que em 2005, na Argentina, o cultivo de soja ocupava 16 milhões hectares. Hoje são 21 milhões [de hectares].
Quando estive com os vizinhos do bairro Malvinas, e as mulheres me diziam que tinham feito circular o documentário “A vida segundo a Monsanto”, me emocionei. Agora, acho que a luta tem que continuar. Gera-me muita dor olhar o estado em que se encontra o país, onde a poluição é muito forte e o glifosato está em todos os lados: na água, na chuva, no solo, nos alimentos…
Essa tomada de consciência de que está falando se aprofunda com a declaração da OMS [Organização Mundial de Saúde] de que o glifosato é cancerígeno…
A classificação da Agência Internacional para a Pesquisa sobre o Câncer (Iarc), que depende da OMS, é muito importante. Muitos não compreendem essa classificação, mas há três grupos, e o glifosato está no grupo 2. Significa que todos os estudos realizados em animais demonstraram que ele é cancerígeno. Isso é muito sério.
Normalmente, os governos proibiriam sua utilização. Atualmente, estou preparando um novo documentário sobre o glifosato e, entre suas características, ele é cancerígeno. Além disso, é um perturbador endógeno e atua como um hormônio. Por isso, há tantos casos de crianças que nascem com malformações congênitas e tantos abortos espontâneos. E, por último, o glifosato absorve os metais do corpo. Ou seja, por um lado te intoxica com metais pesados e, por outro, absorve os bons metais, como o ferro, que precisamos para ajudar a aumentar a imunidade do corpo.
Por isso, penso (e não sou a única) que o glifosato é o maior escândalo sanitário de toda a história da indústria química. Não é comum que um agrotóxico tenha todos esses efeitos. Depois da decisão da OMS, tomou-se a decisão de proibir sua venda livre na França, porque se utilizava glifosato até no quintal das casas.
É uma primeira etapa, mas estamos aguardando que se proíba absolutamente (como se fiz com o DDT), porque ele atua até em doses muito baixas. Há que erradicá-lo, porque não se pode controlar nem dosar.
A Argentina está preparada para dar esse passo e proibi-lo num futuro próximo?
As pessoas têm a consciência de que o modelo “sojero” e os transgênicos são um problema à saúde pública e à ecologia. Falta os governos criarem políticas ao respeito e, para isso, há que repensar as políticas de agricultura.
Dificilmente o glifosato será proibido de um dia para o outro. De todo jeito, encontrei com vários “sojeros” [produtores de soja] em Rosário que já não querem utilizá-lo, porque têm problemas com o mato resistente ao glifosato.
Eles também estão preocupados com a saúde, mas apontam que, para isso, faz falta apoio do setor público. Nos Estados Unidos, foi criada uma empresa para apoiar os “sojeros” que querem deixar os transgênicos. Será preciso aprender tudo de novo.
Por 20 anos, a única coisa que se fez foi fumigar, semear e coletar. Aliás, a maioria das pessoas que hoje estão vinculadas aos cultivos de soja não é formada por agricultores, mas empresários que não moram onde se fumigam. Quem tem que dar o primeiro passo para pôr um freio às fumigações com agrotóxicos: a Justiça ou o governo?
Os dois. Ambos são importantes porque é preciso acabar com o modelo. Tudo é importante: a pressão da sociedade civil, a Justiça que toma medidas para convencer os políticos que este modelo é um suicídio coletivo. É preciso pensar não só a curto prazo, mas também ao médio e longo prazo, porque neste momento o que está em risco é a soberania alimentar da Argentina. Hoje temos produtos de exportação que servem para alimentar animais de outros países, e não pessoas. Isso é vergonhoso.
Ultimamente surgiu uma movimentação de pequenos produtores que fomentam a alimentação orgânica, ainda que seja difícil ter acesso a eles e que o custo seja elevado.
Há muitas maneiras de ter acesso aos alimentos orgânicos. É uma questão de organização. Sempre falo que as alternativas existem, mas o consumidor tem um papel muito importante: tem que ser mais consciente do que está comendo e promover as hortas orgânicas, domiciliarias e comunitárias.
Esse é um movimento mundial que hoje em dia está crescendo. Na França, fomenta-se o cultivo em tetos e em terraços. Na Argentina, há um exemplo muito bom na cidade de Rosário [província de Santa Fé], mas o que vejo que aqui está em falta um Sistema de Certificação. Falam-me das feiras francas, mas a gente não sabe se efetivamente são alimentos orgânicos ou não. Por isso, é preciso trabalhar na certificação. 
Tradução: Maria Julia Gimenez
                   Assista o documentário: "O Mundo segundo a Monsanto" 
*Disponível em:

quinta-feira, 3 de março de 2016

Lançado novo livro sobre Extensão Rural e Agroecologia



Acaba de ser publicado o livro intitulado EXTENSÃO RURAL E AGROECOLOGIA: para um novo desenvolvimento rural, necessário e possível, organizado pelo doutor Francisco Roberto Caporal, professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco. O livro, com 503 páginas, está organizado em cinco capítulos, cujos textos foram escritos pelo Organizador Francisco Caporal e/ou em parceria com outros autores: José Antônio Costabeber (in memoriam), Adriana Calderan Gregolin, Daiane Soares Caporal, Gervásio Paulus e Ladjane de Fátima Ramos.

O primeiro capítulo, trata sobre Extensão Rural e é composto por oito artigos, escritos em diferentes épocas e contextos históricos da Assistência Técnica e Extensão Rural no Brasil e no Rio Grande do Sul. Tais artigos versam sobre diferentes temas, que vão desde a defesa histórica da extensão rural no Brasil, a experiência inovadora da EMATER/RS na perspectiva agroecológica, indo até reflexões mais atuais, do período pós-Pnater de 2003. 

O segundo capítulo, trata sobre Extensão Rural e Reforma Agrária e traz dois artigos sobre a questão tecnológica nos assentamentos de reforma agrária e sobre o papel da Ater nos assentamentos. O terceiro capítulo, intitulado Agroecologia, está formado por nove artigos que abordam diferentes aspectos da Agroecologia. O quarto capítulo, sobre Desenvolvimento Rural, inclui pequenos textos para reflexão e provocação sobre aspectos que dizem respeito ao desenvolvimento rural em geral. O capítulo cinco, sobre Problemas da Agricultura Convencional, também apresenta textos curtos e provocativos sobre impactos do modelo de agricultura industrial que se implantou no Brasil.


O livro pode ser adquirido, pelo valor de R$ 40,00 junto ao Núcleo de Agroecologia e Campesinato - NAC, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, no térreo do Departamento de Educação.
Os interessados em adquirir o livro pelos correios, podem solicitar pelo email ladjane.caporal@gmail.com, informando Endereço e CEP. 

Posteriormente será informado ao interessado o valor total, R$ 40,00 mais o valor  de R$ 8,50 da postagem.  Este valor deve ser depositado na conta: Banco do Brasil, Agência: 3504-1 -  C/C nº 32248-2 . Feito o depósito, deve ser enviado comprovante para o mesmo email. 

Na compra de 10 exemplares haverá desconto de 10%.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Seminário Regional sobre Agroecologia na América Latina e Caribe

Promovido pela FAO, em parceria com várias organizações civis e instituições públicas, foi realizado em Brasília, de 24 a 26 de junho de 2015, o Seminário Regional sobre Agroecologia na América Latina e Caribe. O documento síntese do evento (Informe Final, FAO-Roma, 2015) está disponível AQUI.

Abaixo, transcrevemos o Anexo 2:

Recomendaciones finales del Seminario regional sobre agroecología en América Latina y el Caribe


La agroecología en la región viene siendo construida en la práctica desde hace décadas por los movimientos sociales de agricultores y agricultoras, campesinos/as, comunidades tradicionales, pueblos indígenas y originarios, pescadores y pescadoras artesanales, pastoras y pastores, colectores e colectoras. Tiene una fuerte base científica y recibe cada vez más apoyo de los gobiernos por medio de nuevas políticas públicas. Las prácticas y principios agroecológicos garantizan la soberanía y la seguridad alimentaria y fortalecen la agricultura familiar.


Como resultado del Simposio Internacional sobre Agroecología para Seguridad Alimentaria organizado en septiembre de 2014 por la FAO en el marco del Año Internacional de la Agricultura Familiar, se realizó en Brasilia, del 24 al 26 de junio de 2015, el Seminario Regional sobre Agroecología en América Latina y el Caribe. en el marco del plan de Acción 2015 del Grupo de Trabajo ad hoc sobre Agricultura Familiar y desarrollo Rural de la CeLAC y la declaración Ministerial de la CeLAC sobre Agricultura Familiar, aprobada en noviembre de 2014, en Brasilia, Brasil, y ratificada en la Tercera Cumbre de Jefes de estado y de Gobierno (San José, Costa Rica, enero, 2015), declararon "apoyo para la convocatoria de un evento regional sobre agroecología para fomentar el intercambio de experiencias y la promoción de políticas de desarrollo sustentable." en el marco de la ReAF, en la xx Reunión especializada sobre Agricultura Familiar del MeRCOSUR (Caracas, venezuela, diciembre de 2013) se incorporó el tema de la agroecología en la agenda del Grupo Temático para Adaptación a los Cambios Climáticos y Manejo y Gestión de Riesgos.


Tomando en consideración la declaración de Nyeleni-Mali sobre Agroecología elaborada por los movimientos sociales de agricultores y agricultoras, campesinos/as, comunidades tradicionales, pueblos indígenas y originarios, pescadores y pescadoras artesanales, pastores y pastoras, colectores y colectoras y jóvenes. Las y los participantes del seminario de los movimientos sociales, académicos, representantes de entidades públicas de los países de América Latina y del Caribe e invitados de otras regiones, reunidos/as en este Seminario instan a los Gobiernos de la Región, a la CeLAC, a la FAO, a ReAF/ MeRCOSUR y otros organismos intergubernamentales e internacionales relevantes, a:


1. Promover políticas públicas de fomento a la agroecología y la soberanía alimentaria, definidas, ejecutadas y monitoreadas con activa participación de los movimientos sociales y de la sociedad civil organizada, asegurando el presupuesto necesario para su implementación.

2. Formular y ejecutar marcos legales y reglamentos favorables al avance de la agroecología para alcanzar la soberanía alimentaria.

3. Asegurar la función social de la tierra y del agua por medio de la reforma agraria, de políticas de tenencia de tierras y que garanticen los derechos territoriales de los pueblos indígenas, originarios y pueblos y comunidades tradicionales.

4. Promover la producción de alimentos adecuados y saludables y la soberanía alimentaria de la región por medio de la agroecología, reconociendo que estos sistemas permiten un uso más sustentable de la tierra, del agua y de la energía.

5. Reconocer y valorizar los conocimientos ancestrales, tradicionales, saberes locales y las identidades culturales como fundamento de la agroecología. Y que los institutos públicos de investigación respeten y valoricen los saberes tradicionales promoviendo el diálogo de saberes en sus programas de investigación participativa.

6. Fomentar dinámicas territoriales de innovación social y tecnológica por medio de la creación y/o fortalecimiento de núcleos de agroecología y en instituciones de carácter interdisciplinar e intersectorial, con capacidad de articular procesos de educación, investigación y aprendizaje.

7. Desarrollar políticas específicas que promuevan la organización productiva de las mujeres, apoyando sus iniciativas agroecológicas, fortaleciendo la superación de los obstáculos que ellas enfrentan, la sobrecarga de trabajo, la despenalización apuntando al reconocimiento de su papel histórico para la agroecología y para la soberanía alimentaria.

8. Reconocer y fomentar el rol activo de las familias y comunidades, incluyendo mujeres y jóvenes, como tutores de la biodiversidad, especialmente semillas y razas criollas. Y garantizar que los bancos públicos de germoplasma restituyan a los movimientos sociales sus recursos genéticos conectando la discusión sobre soberanía alimentaria con la discusión de protección de las semillas.

9. Construir una red regional en América Latina (plataforma de gestión mixta entre los gobiernos y movimientos sociales) de intercambio, de prácticas y de informaciones sobre agroecología que favorezca el diálogo entre academia, gobiernos y movimientos sociales.

10. Crear instrumentos que permitan la reciprocidad de los sistemas participativos de garantía entre los países de la región latino-americana promoviendo las relaciones entre productor y consumidor.

11. Incluir la agroecología como tema permanente en la agenda del grupo de trabajo sobre agricultura familiar y desarrollo rural de la CeLAC, ampliando la participación de los movimientos sociales y de la sociedad civil organizada y academia en ese GT, con apoyo de la FAO.

12. Crear un programa de intercambio sobre agroecología y semillas a partir del GT de Agricultura familiar y desarrollo rural de la CeLAC.

13. Proponer la creación de un grupo de trabajo específico en la ReAF sobre agroecología y ampliar la discusión de registros específicos de la agricultura familiar incluyendo la agroecología.

14. Crear condiciones para restringir las prácticas de monocultivos, uso de agro tóxicos, y concentración de la tierra a fin de propiciar el escalonamiento de la producción campesina de base agroecológica en la región latino-americana y caribe.

15. Apoyar iniciativas de educación formal y no formal, como las escuelas campesinas de agroecología elevando la escolaridad en el ámbito rural por medio de la formación profesional de jóvenes del campo.

16. Reconocer el papel multifuncional que la agroecología de base campesina desempeña en preservar suelos, aguas, biodiversidad y proporcionar otras funciones eco sistémicas,

garantizando la preservación ambiental de forma socialmente inclusiva y económicamente justa.

17. Asumir que los sistemas agroecológicos son más resistentes a los cambios climáticos y solicitar que se asignen recursos para el desarrollo de la agroecología, como parte de políticas climáticas que garanticen la soberanía alimentaria de los pueblos.

18. Crear mecanismos para promover la cooperación sur-sur en el tema de la agroecología en colaboración con FAO, ReAF y otros organismos internacionales y sub-regionales.