terça-feira, 29 de outubro de 2019

E se o vazamento fosse de uma central nuclear?

Heitor Scalambrini Costa
Professor aposentado da UFPE.
Graduado em física Unicamp/SP, mestre em Ciências e Tecnologia Nuclear/UFPE,
Doutor em Energética Universidade de Marselha-Comissariado de Energia Atômica/França


Um debate que gera muita polêmica, e que está em evidência no mundo de hoje pós Fukushima, diz respeito ao modo de produzir energia elétrica utilizando o combustível nuclear.

No Brasil este assunto voltou a tona depois da eleição do governo de extrema direita. A ascensão do almirante da marinha Bento Júnior como ministro de Minas e Energia, e sua entrevista (jornal Folha de São Paulo em 7/12/2018), mesmo antes de tomar posse, deixou claro a prioridade do governo no incentivo que seria dado a energia nuclear para produção de eletricidade, e para gerar força motriz de submarinos. 

As duas usinas nucleares instaladas no Rio de Janeiro (Angra 1 e Angra 2) produziram em 2018, uma irrisível contribuição de 2,5% da energia elétrica gerada no país. Logo, sem nenhuma influência significativa na oferta de energia elétrica.

Angra 3 em construção desde 1984 (iniciada há 35 anos), considerada a obra de infra-estrutura mais “enrolada” do Brasil, sofreu sua primeira interrupção em 1986 por questões econômicas. Retomada em 2010, novamente foi paralisada em 2015. Além da falta de recursos para finalizá-la, a Operação Radioatividade, segundo as investigações realizadas pela polícia federal, envolveu o também almirante Othon Pinheiro da Silva, ex presidente da Eletronuclear, em crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, que acabou levando a sua condenação (43 anos de prisão). 

Como prioridade governamental, Angra 3 para ser concluída precisa ainda algo em torno de 3 bilhões de dólares (12 bilhões de reais). Sendo que 70% dos equipamentos e materiais já foram comprados (na mesma época dos equipamentos de Angra 2), e estão armazenados até hoje. Os equipamentos já adquiridos  são de um modelo de reator ultrapassado, o mesmo do acidente de Fukushima, um PWR (Pressurized Water Reactor) de 2ª geração.

Todavia, apesar deste histórico de Angra 3, sua conclusão e a construção de uma central com 6 novos reatores no município de Itacuruba-PE, na beira do Rio São Francisco, está prevista para até 2050, com recursos financeiros envolvendo aproximadamente 33 bilhões de dólares (132 bilhões de reais). 

Pouco se sabe como se dará estes investimentos, de onde virá os recursos para terminar a construção de Angra 3 e construir 6 novas usinas, quais os modelos de negócios que regerão tais empreendimentos. O que se sabe é que Angra 3 foi incluída no Programa de Parcerias e Investimentos (PPI). 

Estas obras faraônicas e megalomaníacas, caso sejam levadas adiante, sem justificativa do ponto de vista econômico, da sustentabilidade e da segurança energética, da questão social, da ética (levando em conta que os resíduos radioativos serão deixados para as gerações futuras); além da questão ambiental, poderão ter reflexos catastróficos para o Nordeste, para os sertanejos. 

Esta discussão sobre a instalação de usinas nucleares no país é fundamental, ainda mais nos dias atuais em que um vazamento de óleo cru, de origem “indefinida (?)”, invadiu mais de 25% da costa brasileira. Ficando assim demonstrado neste episódio uma clara conduta de omissão,  de incapacidade do governo federal, responsável pela implementação do Plano Nacional de Contingência (existe desde 2013), de definir estratégias para emergências ambientais, de lidar com situações desastrosas (vide também os incêndios na Amazônia). 

Claro que a a negligência, a incapacidade e o despreparo do governo diante de desastres/crimes ambientais já ocorridos, tem que ser levados em conta, principalmente quando se anuncia a construção destes verdadeiros “monstros adormecidos”, que são as usinas nucleares, e do potencial de destruição da vida que carregam intrinsecamente, caso ocorra acidentes severos, de vazamento de material radioativo.

Somos contra estas usinas, não só porque o Brasil tem outras opções de produzir energia elétrica, a partir de fontes renováveis de energia, mais barata, menos agressiva ao meio ambiente, e mais segura. Mas também pelo princípio da precaução, da incerteza científica.
A incerteza científica, ao contrário de permitir a atividade potencialmente danosa, impede-a como elemento essencial do princípio da precaução. Tal princípio no direito ambiental é uma construção que leva em conta a razoabilidade e a proporcionalidade, como bem define o da professor Mauricio Mota Universidade Estadual do Rio de Janeiro em seu trabalho intitulado “Princípio da Precaução no Direito Ambiental: uma construção a partir da razoabilidade e da proporcionalidade”.  Lembrando também que a própria Constituição da República (em plena desmontagem no atual governo)  estabelece em seu artigo 225, caput, que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Ora, vazamento de material radioativo por uma usina nuclear é possível sim, e já aconteceu em passado recente. Não se pode admitir argumentos que tentam minimizar o risco, e mesmo negar que  tal risco exista. E existindo o vazamento, caso aconteça, seria devastador, pois é incomparável a qualquer outro tipo de desastre, como queda de avião, rompimento de barragens, etc. 

Os elementos radioativos vazados do núcleo do reator  contaminariam o ar, a terra, o solo. Nada mais oportuno lembrar que absorção da radiação emitida é acumulativa, aumenta com o tempo pois os radionuclídeos se acumulam no corpo da população exposta. O que acarretaria sérios prejuízos já conhecidos a saúde humana e de todo ser vivo, ao longo de dezenas, centenas e mesmo milhares de anos.

Então diante de tantos fatos, de tantas constatações, de tantas evidências o que leva o governo brasileiro a tantas maledicências, a tantos descalabros, em propor usinas nucleares em nosso país? Talvez por uma simples razão: a de não gostar do povo brasileiro, do povo nordestino.

Em Pernambuco estamos diante de uma proposta de emenda a Constituição Estadual que mudaria o artigo 216, que veda a instalação de usinas nucleares em seu território. A PEC proposta pelo deputado Alberto Feitosa tiraria este impedimento constitucional, caso sua admissibilidade seja aceita pela Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, e em seguida iria para votação em plenário. Precisando assim maioria simplificada de votos, ou seja 2/3 do total de deputados (49), ou seja 33 votos para ser aprovada.

Esta insanidade, caso aprovada, seria de triste memória para os legisladores pernambucanos. Portanto é hora da pressão democrática sobre os deputados. Pois como diz o poeta: quem sabe faz a hora, não espera acontecer.

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Vuelve el tema de la tierra y del mundo rural: las desigualdades de siempre

Francisco Roberto Caporal
Recife, 03/10/2019.


En Brasil, datos del último Censo Agropecuário, realizado en 2017, muestran que hubo un crecimiento del número de unidades de producción con área de más de 1000 ha. En el total son 50.865 grandes haciendas que detienen un 47,6% de las tierras dedicadas a la agricultura, pecuaria y forestería, con un área media de 3.300 ha. O sea, más o menos 1% del total de las unidades de producción posee casi 50% del área total. En la otra punta, los pequeños con hasta 10 ha representan un 50% del total de unidades de producción y detienen algo como 2% del total de las tierras. Estas unidades de producción con menos de 10 ha tienen área media de 3,14 ha (IBGE, 2018).  

Es importante registrar que, en relación al Censo de 2006, el número de tractores ha crecido un 50%, pero este crecimiento fue concentrado en 15% de las unidades de producción. De igual modo, el crecimiento del riego llegó a 52% en el mismo periodo. (IBGE, 2018)

Desde el punto de vista social las cosas empeorarán. Por ejemplo, el número del personal ocupado en la agropecuaria ha disminuido en 1,5 millones de personas. Asimismo, las personas que se quedan en el campo están cada vez más viejas, o sea, 75% de los productores tienen 45 años o más. Por otra parte, el campo brasileño sigue siendo desigual cuando el tema es la educación formal. En este caso, 16,5% de los productores nunca fueron a la escuela, un 79% estudió los años iniciales esto es, no pasaron de la escuela fundamental. Todo ello explica porqué un 23% no saben leer ni escribir. (IBGE, 2018)

De lo arriba se puede decir que el modelo de agricultura industrial productora de commodities en Brasil sigue generando concentración de la tierra y exclusión social. Pero no es solo un privilegio de Brasil. Otros países productores de commodities en la región presentan escenarios semejantes. En este sentido, según el informe de CEPAL, FAO, IICA (2012), los datos disponibles para la región presentan una tendencia a la concentración de las tierras. El informe da cuenta que no hay datos censitarios actuales para todos los países de la región, pero los censos más recientes de Chile, Argentina, Brasil y Uruguay, donde el sector agropecuario está netamente orientado hacia las exportaciones de commodities, comproban el proceso de concentración de las tierras.

Así, de acuerdo con CEPAL, FAO, IICA (2012), en Chile, hubo una reducción de 9% en el número de explotaciones, en los últimos diez años (1988 y 2002), con diferencia en las zonas de “agricultura moderna” donde hubo una caída de 20% en algunas de ellas. En la Argentina, el número de explotaciones agropecuarias disminuyó en un 20,8% entre 1988 y 2002. Lo mismo pasó en Brasil donde entre 1985 y 2006 hubo una reducción de 10,7% en el número de explotaciones. Por otra parte, el caso de Uruguay también presenta datos importantes. En aquél pais, el número de explotaciones ha descendido de las 86.928 en 1961 a 57.131 en 2000. Además, un 96% de esta disminución está concentrada en fincas de hasta 99 ha. El caso de México es una excepción que confirma la hipótesis de la concentración como resultado de la apuesta por las commodities. En aquél pais, entre 1991 y 2007 hubo un incremento del 7,8% en el número de explotaciones. Ello indica que en México sigue ocurriendo un proceso de minifundización una vez que la superficie pormedio ha reducido de 8 a 7,3 hectáreas.

Otra información importante para el análisis de la Agroecología Política y también relacionada al modelo capitalista industrial de producción de commodities es el proceso de continuado de extranjerización de las tierras agrícolas en la región. Brasil, quizás sea el ejemplo más elocuente de este proceso. Según datos presentados en un informe de la FAO (2012), en el 2010 había un total de 34.371 inmuebles rurales de propiedad de extranjeros con una superficie total de 4.348.822 hectáreas. Del total de explotaciones en anos de extranjeros 3,6% representan propiedades con superficie superior a los 500 hectáreas lo que abarca un 61,2% del total de la superficie. Una Mirada desde el punto de vista productive dá cuenta que estos inmuebles están dedicados mayormente a la ganadería, silvicultura, producción de granos y extracción.    

Sobre el tema, la FAO escribe:

“En definitiva, la concentración y globalización (“extranjerización”) de la tenencia de la tierra son parte del proceso de modernización de la agricultura y del sistema alimentario, el que a su vez, es la expresión de la lógica del modelo de desarrollo vigente.” (FAO, 2012)
Y, concluye:

“En la actualidad, el proceso de concentración y de globalización de la tenencia de la tierra es un reflejo de estos mismos fenómenos que ocurren en las cadenas de valor, en las cuales aquella forma parte. En otras palabras, estos fenómenos de concentración y de globalización ocurren en la totalidad de los eslabones que componen las cadenas, siendo uno de ellos, el de la tenencia de la tierra. A su vez, la concentración se puede observar en la propiedad de la tierra y en el uso de la tierra.” (FAO, 2012)

El mismo informe destaca que la concentración tal y cual la extranjerización, tiene un carácter excluyente pues si por un lado es responsable por procesos de expulsión de campesinos y comunidades tradicionales, por el otro genera obstáculos para el acceso a una parte de la población que quiere trabajar en la tierra. Además, estos fenómenos están relacionados con el tema de la soberanía de los Estados. En este sentido el informe llama la atención para el hecho de que “la concentración de la propiedad de la tierra y su acaparamiento, genera dificultades para que los Estados puedan ejercer la soberanía en su territorio y una adecuada gobernanza de los recursos naturales, preferentemente la tierra.” (FAO, 2012)


Fuentes:

CEPAL, FAO, IICA. Perspectivas de la agricultura y del desarrollo rural en las Américas: una Mirada hacia América Latina y el Caribe. Santiago, Chile: FAO, 2012.

FAO. Dinámicas del Mercado de tierra en América Latina y el Caribe: concentración y extranjerización. Santiago, Chile: FAO, 2012.