Heitor
Scalambrini Costa
Professor da
Universidade Federal de Pernambuco
O maior
e mais completo estudo já realizado sobre impactos da mudança climática no
Brasil foi divulgado no final de outubro. Trata-se do “Brasil 2040 –
Alternativas de Adaptação às Mudanças Climáticas”, encomendado pela Secretaria
de Estudos Estratégicos da Presidência da República a grupos de pesquisa do
país.
O
trabalho buscou estudar e conhecer melhor como o clima poderá variar no Brasil
nos próximos 25, 55 e 85 anos, de forma a fundamentar, e assim apoiar políticas
públicas de adaptação em cinco grandes áreas: saúde, recursos hídricos,
energia, agricultura e infraestrutura (costeira e de transportes).
As
revelações apontadas pelos modelos de simulação utilizados no estudo mostram,
em todos os cenários, que em 2040 o país será mais quente e mais seco. As temperaturas
médias nos meses mais quentes do ano podem subir até 3oC em relação
às médias atuais no Centro-Oeste. A região Sul tende a ficar mais chuvosa,
enquanto o Sudeste, o Centro-Oeste e partes do Norte e Nordeste teriam reduções
de chuvas, em especial nos meses de verão, diminuindo assim a disponibilidade de
água no semiárido.
Um dos efeitos dramáticos será a redução na
vazão dos rios que abastecem a maior parte da população brasileira. No melhor
cenário, vários rios de Minas Gerais, São Paulo, Goiás, Tocantins, Bahia e Pará
terão reduções de vazão de 10% a 30%, no melhor cenário Além da água para
abastecimento humano e animal, as hidroelétricas sofrerão uma redução na
produção de energia. As mais importantes usinas do País – Furnas, Itaipu,
Sobradinho e Tucuruí – teriam reduções de vazão de 38% a 57% no pior cenário.
Daí surge à necessidade de definição urgente
sobre questões relacionadas ao planejamento da matriz energética.
Definitivamente é um ponto de interesse de toda sociedade brasileira, e não pode
mais ser decidido por um pequeno grupo de pessoas que atualmente compõem o
Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). Os problemas decorrentes das
decisões tomadas por este grupo, formado majoritariamente por ministros de
Estado, refletem em toda sociedade brasileira. E ela, mais do que nunca exige
participar e decidir sobre a política energética a ser adotada.
Fica claro que a melhor maneira de adaptar as
mudanças climáticas é reduzindo emissões dos gases de efeito estufa, em
particular o CO2. Assim é preciso aumentar em muito a eficiência
energética (completamente negligenciada pelo poder público), usar mais as
fontes renováveis de energia, de modo a reduzir a dependência de termelétricas
fósseis e de hidrelétricas, e cobrar um preço pelas emissões de carbono dos
setores que mais emitem. Sem contar com
o afastamento definitivo de nosso território desta perigosa e cara opção, as
usinas nucleares.
No atual contexto já vivenciamos uma crise
hídrica que atinge as diferentes regiões do país, em maior ou menor grau. No Nordeste
a situação é dramática diante da quantidade de água acumulada nos
reservatórios. Tomando como exemplo um dos maiores lagos
artificial do mundo, o de Sobradinho com 828 km² de área e 32.200 km³ de água,
seu volume de armazenamento atingiu em 12/11 o correspondente a 5,4% do total.
Com a cota de água atingindo 381,44m, praticamente o limite para a produção de
energia.
Enquanto os cientistas apontam em suas pesquisas,
nos estudos que realizam a necessidade urgente de diminuir as emissões dos
gases de efeito estufa, evitando assim o aumento médio da temperatura do
planeta, e todas suas consequências, os governantes agem como avestruzes diante
das evidências. Em Pernambuco não é
diferente.
Sabemos que a hidrologia florestal trata das
relações entre as florestas, matas e a água, abordando a influência que causam
sobre o ciclo hidrológico, e também como a principal salvaguarda dos mananciais
de água, garantindo as vazões dos rios, e assim água para as necessidades
humanas e animais, além dos usos na agricultura, na indústria, no fornecimento
de energia. Portanto é inquestionável sua
importância, tanto no âmbito ambiental, social e econômico. Logo, as más
utilizações dos recursos ambientais ocasionam sérios problemas na biota, que
consequentemente compromete a qualidade de vida, assim como, influencia o clima
e os ciclos biogeoquímicos em uma dada região.
Todavia em Pernambuco, nos últimos 9 anos tem
sido fato corriqueiro o desmatamento desenfreado dos vários biomas, da caatinga,
aos resquícios da Mata Atlântica existente, da restinga e dos manguezais. Dados oficiais apontam que no período 2007 a
2015 foram aprovadas 51 leis autorizando a supressão de 5.034 ha de vegetação
nativa em área de proteção permanente (APP) para empreendimentos privados e
públicos, de forma totalmente irresponsável do ponto de vista ambiental, sem
qualquer discussão mais aprofundada na Assembleia Legislativa, onde o Governo
tem total maioria.
Mesmo as leis aprovadas de supressão exigir as
compensações de plantio, muitas vezes é feitas em local distante do dano, são
definidas em acordos escritos sobre os quais não há fiscalização acerca do
cumprimento. Restam simplesmente as afirmativas dos gestores públicos sem
nenhuma comprovação.
Achando pouco, o próprio Governo do Estado suprimiu
a exigência legal do Estudo de Impacto Ambiental (e com ele as audiências
públicas) para a supressão nas APP`s, especialmente para favorecer
empreendimentos que alegam serem de interesse público. Com isso em muitas áreas
o risco é grande de atingir as nascentes de riachos que são os afluentes de
bacias hidrográficas importantes para o abastecimento de água. Em particular as
áreas riscos são os “brejos de altitude”, encontrados no Agreste e no Sertão
pernambucano.
Estas áreas
de altitudes elevadas são as mais ambicionadas para os projetos de
aproveitamento da energia dos ventos. Em consonância aos interesses dos
“negócios das eólicas”, o governo de Pernambuco, sem nenhuma precaução e
cuidado, atraem os empreendedores com um conjunto de incentivos e benefícios, como
a desobrigação de apresentarem Estudo de Impacto Ambiental e autorização legal
para desmatar essas áreas. Parques
eólicos com dezenas e centenas de aerogeradores estão sendo autorizados a se instalarem
em áreas de preservação permanente, áreas de mananciais.
Esta
irresponsabilidade ambiental acarretará a remoção da cobertura vegetal, e assim
agravará a crise hídrica no Estado. Em torno de 20% do total autorizado para
desmatamento, nestes últimos anos foi para atender a instalação dos parques
eólicos. Logo, o discurso do ambientalmente correto, ao considerar a energia
eólica uma “fonte limpa” esconde práticas socioambiental injustas.
Outra situação que merece destaque é o polo de
termoelétricas a combustíveis fósseis que já estão instaladas, ou que foram
anunciadas. Todas elas concentradas no Complexo Industrial Portuário de Suape -
CIPS (Termope com 520 MW a gás natural, Suape II de 380 MW a óleo combustível,
Novo Tempo, recém-anunciada a gás natural liquefeito com 1.238 MW, a
termelétrica da Petrobras para servir a Refinaria Abreu e Lima de 200 MW a óleo
combustível). Além da termelétrica a óleo diesel Termomanaus e Pau Ferro I
construídas na Área de Preservação Ambiental Aldeia-Beberibe com 240 MW (576
motores instalados). Grandes emissores de gases de efeito estufa tais
termoelétricas somam uma potência instalada em torno de 2.600 MW.
Estima-se que se todas estas termoelétricas estiverem
funcionado conjuntamente as emissões de CO2 atingirá a soma de 25.000
tonelada/dia, ou 750.000 toneladas/mês, ou ainda aproximadamente 9 milhões
toneladas/ano. Uma significativa contribuição às emissões regionais de gases de
efeito estufa.
Portanto, entre o discurso e a prática dos
governantes pernambucanos vai uma diferença abismal. Enquanto sem nenhuma
consequência prática promovem seminários internacionais, discursam sobre as
mudanças climáticas; subtraem as reais informações para a sociedade, e agem
sorrateiramente contra o meio ambiente, a vida. Comprometem assim a qualidade
de vida das gerações presente e futuras, que no final das contas é quem pagará
pelos desmandos destes mesmos governantes.
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